O Prédio dos Ricos

Esta semana no autocarro, vinha a ouvir a conversa, entre duas miúdas. Era impossível não ouvir porque vinham sentadas à minha frente. 

Miúda 2: Eu sei onde moras, já te lá fui por uma vez.

Miúda 1:  Pois foi, mas eu pedi ao teu pai para me deixar na paragem ou à porta do prédio?

Miúda 2: Sei lá, não me lembro...

Miúda 1: É que eu moro em CN, mas nos prédios feios, que são os que estão ao lado dos prédios dos ricos... 

Ouvir esta conversa deixou-me profundamente triste...

Uma miúda tão nova e já com umas frustrações tão grandes...   

Eu conheço a zona em questão, e por acaso para distinguir falamos dos da zona nova e da zona antiga. 

Conheço pessoas que moram na zona nova ( zona dos ricos ), tem bons trabalhos, estudaram bastante para isso e agora puderam comprar uma casa nova a estrear. Mas não são ricos. Vivem bem, mas trabalham bem.

Talvez pudessem ter explicado isso à miúda lá em casa, e talvez até lhe pudessem ter dito que se ela se esforçar na vida pode vir a ter igual ou mais... É que " prédio de ricos ", parece que as pessoas já nascem ricas. Não fazem pela vida, e isso é errado.

É que para alem da expressão que usou, foi a expressão facial que colocou... Aquela frustração escondida atrás da arrogância...

E a pergunta de querer saber onde a deixaram leva-me a acreditar que para alguns, ela sente-se confortável para deixar saber onde mora, para outros pede para deixar na paragem, assim não sabem se mora na zona nova ou não...  

Eu tenho um filho... e estas coisas assustam-me... 

Comentários

  1. Concordo plenamente contigo. Em Lisboa sempre morei num prédio antigo, com isolamento terrível, sem elevador. A verdade é que os meus pais nunca fizeram disso um escândalo, éramos 5 e vivemos num T2 com um wc mas eu pude ir estudar para os Açores que era o meu sonho e conheço alguns que tinham casas xpto, 2 ou 3 carros, comiam fora várias vezes por semana, mas ir estudar para o Porto não que é caro e vai exigir baixar o nivel de vida por uns tempos...
    Pobreza de espírito é do pior que há!

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  2. Por muito que possamos tentar incutir algumas ideias e valores nos nossos filhos, isso, infelizmente, não impede que eles possam vir a ter vergonha das suas origens, das pessoas que os criaram.

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  3. Essa questão do esforço para se chegar a algum sitio é uma ideia para trabalhar com cuidado.
    Nem oito nem oitenta.
    Nem toda a gente consegue, e por outro lado... nem toda a gente tenta...
    A realidade às vezes é muito dura, mesmo para quem muito se esforçou, e outras vezes parece que tudo se encarrilha com uma facilidade tremenda.

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    1. É verdade. Sempre senti que meus pais acreditavam piamente que estudos e boas notas eram suficientes para arranjar um bom emprego. Tentei fazer-lhes ver que era preciso mais, que aquilo não bastava. Ainda hoje acho que lhes custa perceber que o seu "sonho" de dar aos filhos os estudos que não puderam seguir, de pouco adiantou para lhes mudar a vida e os afastar das dificuldades financeiras.

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  4. É, de facto, muito triste. Mais triste por ela sentir vergonha, sabemos que são adolescentes mas... O importante seria ela saber que trabalhando tudo se alcança, o sucesso e o dinheiro não caiem do céu! Quem sabe se os pais não moram ali precisamente para terem dinheiro para ela estudar! Mas hoje em dia incute-se muito aos meninos os objectos, a roupa xpto, o tlm topo de gama, o ir viajar e jantar fora... e pouco o trabalho, como se tudo caisse no céu! Tive uma vida dura, com períodos complicados mas lá está com estudo e trabalho tudo se consegue. Os meus pais sempre me motivaram a estudar e querer sempre mais.

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  5. Esses juízos por parte dos miúdos são muito chatos. Cá por casa, tentamos ao máximo incutir o correcto aos nossos. Mas muitas vezes, em conversas uns com os outros dá nisto...

    Beijinhos.
    Sandra C.
    bluestrass.blogspot.com

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  6. Fica esta reportagem sobre pobres e ricos e o trabalho!
    https://life.dn.pt/beatriz-araujo-da-caixa-de-supermercado-para-a-faculdade-de-medicina-com-194-valores/?fbclid=IwAR3kWw0-cO9e9ATUPhxep1Dr_0B-gavdC1ZgxkubeZ5Jj1bp9x9hlSVYq1w

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  7. Os miúdos sofrem muito com a possível diferença de classes, porque os pais muitas vezes também salientam as diferenças.
    A pobreza de espírito é um flagelo na nossa sociedade.

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  8. Triste ter-se vergonha das origens. Há miúdos que sofrem com isso, em especial quando tem pais que pouco fazem para melhorar, acomodaram-se às coisas, ou então, é-lhes mesmo impossível mudar. Deveriam conversar com os filhos e explicar-lhes a situação para não caírem no erro da vergonha.

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  9. Adorei a frase da foto.
    É muito triste os adolescentes que sofrem com vergonha das origens.
    Muitas das vezes acho que nessa época da vida temos tanto que valorizar mas não o vemos....

    http://arrblogs.blogspot.com

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  10. Uma boa conversa pode resolver muita coisa, porque é na base da comunicação que quebramos estereótipos, inseguranças e frustrações. Além de que compreendemos muito melhor determinados aspetos da vida social

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    1. Tão certo! Mas cada vez mais as pessoas prestam-se menos ao diálogo. É paradoxal. Simplesmente CORTAM relações. Deus deu-nos o dom da fala e da linguagem. Não sabemos usá-la corretamente.

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  11. É o tipo de coisa que também me assusta.
    Recentemente fiz um post (ão) sobre a forma como as novas tecnologias são o meio pelo qual os jovens interagem e namoram. É A-SSUS-TA-DOR a crueldade! O que acho que o teu post revela muito bem é a ausência de ensinamentos que a sociedade parou de transmitir. Antigamente ao menos a pessoa tinha discernimento. Se era um advogado, um médico, elas, as pessoas mais simples, na sua HUMILDADE, sabiam que a pessoa estudou e por isso estava bem na vida. Sem inveja. Era-se mais inteligente com poucos estudos do que agora, em que a escolaridade está ao alcance de todos.
    Agora pensam que é factor de sorte. Que é até alcançável só PELO DESEJO ou pela SORTE ou por um REALITY SHOW...

    Mete medo, mete.

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  12. Concordo. Mas infelizmente até os adultos pensam dessa forma. Noto isso quando alguém viaja para fora do país. As pessoas comentam logo e dizem que A ou B apenas foi para fora porque é rico. Mas nem sequer se lembram que secalhar as pessoas trabalham o ano inteiro e poupam ao longo do ano para depois poderem ir de férias durante uns dias!

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  13. O mal das pessoas é valorizarem-se pelo que têm e não pelo que são. E muitas vezes a vida dá voltas e quem tinha deixa de ter, e lá vêm as depressões.

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  14. Não é fácil lidar com o estigma da diferenciação e, se não o é para os adultos, que muitas vezes passam a vida toda com esqueletos escondidos dentro do armário nunca conseguindo lidar com as suas frustrações, facilmente percebemos que muito mais difícil é para as crianças, que ainda estão a formar a sua personalidade e opinião sobre o mundo em redor, e que não percebem o porquê de terem que crescer num mundo de tantas diferenças sociais.

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